O culto aos Orixás no
Brasil em suas várias vertentes – diversidade -, inclusive a Umbanda que em
muitos terreiros cultua os Orixás na forma africana e não sincretizada com o
catolicismo, tem um corpo literário que não é muito conhecido, notadamente no
seu aspecto ético.
Afirmamos sempre que nos
referimos a Orixá, sejam quais forem as religiões que se formaram na diáspora,
que existe um código ético original sustentador, ao contrário do que dizem
alguns sacerdotes e pesquisadores da academia. O conhecimento religioso, ético,
epistemológico, está registrado em versos (provérbios, parábolas) que são
divididos em 16 capítulos ou signos principais. Cada capítulo corresponde a um
Odù, que significa destino. Assim são 16 Odùs e cada Odù tem um conjunto
variável de histórias contadas em versos, parábolas e provérbios, em verdade
enredos pensados pelos diversos Babalaôs (Pais de Segredo) para que os
ensinamentos pudessem ser entendidos pelos iniciados e ao mesmo tempo serem
velados (protegidos) dos leigos, de fora, não iniciados na confraria de Ifá
existente na época. Podemos dizer que cada Odù pode ter até 16 histórias, em
tamanhos diferentes que podem ir de poucas linhas até páginas inteiras.
Freqüentemente, ouvimos de
espíritas, espiritualistas universalistas e até ditos umbandistas – não todos -
que as religiões tradicionais africanas – nos referimos ao culto aos orixás -
não são baseadas em nenhum sistema ético.
Pasmem! Até algumas
lideranças no meio afro-descendente da diáspora consideram suas religiões
aéticas, o que nos faz pensar que tudo podem fazer que não haverá uma quebra de
honradez (decoro) dos seus sacerdotes e adeptos, contrariando frontalmente suas
raízes ancestrais. Um grande equívoco que precisa urgentemente ser corrigido,
inclusive em algumas “umbandas”. Ao longo dos anos temos recebido relatos
verídicos de sérios casos de abusos da fé alheia por sacerdotes venais aéticos.
Hoje com o advento das redes sociais, em qualquer lugar com acesso a rede
mundial, podemos pedir “socorro” a um irmão em outro terreiro se temos dúvida
do que estão se propondo a fazer conosco em nome da religião. Especificamente
quanto às “umbandas”, fomos procurados com pedidos de ajuda, de orientação, nos
seguintes casos reais, que nos causam estupefação, mas que infelizmente pode
estar se repetindo em algum lugar de nosso país:
- o dirigente proíbe o
médium, do sexo masculino, de incorporar exu feminino, Bonbojira (popular
pombagira) no caso da Umbanda, ou no mesmo raciocínio de preconceito e abuso, o
sacerdote proíbe o médium de ter uma entidade feminina de frente, como o são as
caboclas, afirmando que se isto ocorrer o deixará afeminado. Aqui fica
demonstrado o preconceito de gênero (quando a médium é mulher e a entidade
masculina não existe nenhuma proibição), transferido para os espíritos, em
desrespeito ao médium, o que causa profundo trauma;
- o “pai de santo” diz que
os banhos de amaci (ritual de lavagem da cabeça com o sumo extraído de folhas
maceradas) têm que ser feito sem roupa. Ele “incorpora” o guia chefe e a
entidade é quem faz o banho. O dito “pai de santo” é jovem e se diz
inconsciente. Tal procedimento não tem nenhum fundamento nos ensinamentos
contidos no corpo literário de Ifá e é um claro exemplo de mistificação;
- o chefe de terreiro
exige que os médiuns façam a consagração com Exu. Para tanto, as médiuns
mulheres, uma de cada vez, terão que incorporar a sua “pombagira” e ele,
incorporado do seu “exu”, deverão ter relações sexuais. Tudo terá que ser
guardado em segredo e acontecerá durante o período de recolhimento individual
para aplicação dos rituais.
Infelizmente estes relatos
são recentes e reais, ocorreram em terreiros que se dizem de “umbanda” neste
Brasil, contrariando frontalmente o corpo ético e literário de Ifá. Ao
contrário do que muitos pensam, a moralidade africana – nagô - é fruto da
religião.
Obviamente que imoralidade não dá sustentação em nenhum sacerdócio.
Numa sociedade que ainda ser educado é ser europeizado, nós umbandistas ainda
somos vistos como ignorantes, analfabetos e sem cultura. Os casos relatados só
contribuem para que sejamos mais preconceituados do que já somos.
Lamentavelmente, os
princípios de educação e formação moral baseados no bom caráter, contidos no
corpo literário de Ifá, que deveriam ser aplicados em todos os sentidos da
vida, que inclui o respeito aos mais velhos e as tradições ancestrais,
lealdade, honestidade e assistência aos necessitados, estão esquecidos em
muitos – não todos – que são simpatizantes do culto aos Orixás por dentro da
Umbanda – ou “umbandas”, tantas são as facetas ainda incompreendidas da Senhora
da Luz velada em nossa
pátria.
Axé,
Norberto Peixoto