Chico Xavier, o maior
médium de todos os tempos? Divaldo Franco, seu sucessor? Exageros pueris.
Desconhecimento das fontes histórico-doutrinárias do Espiritismo, ou franca
discordância em relação às mesmas. Eis aqui uma prova, com a benção da lucidez
kardeciana, ao traçar linha divisória entre a eventual excepcionalidade dos
fenômenos (sim, providenciais) e a qualidade, porém, dos conteúdos por eles
obtidos, coisa bem diversa. Matéria que deveria ser lida e relida pelo público
espírita, em parte, assaz deslumbrado, místico e infantil. Nela, Kardec se
refere a um jovem médium de que lhe falaram...
Esse
jovem é, pois, um médium em toda a acepção da palavra, e dotado, além disso, de
múltiplas faculdades, pois, ao mesmo tempo, é médium escrevente, falante,
vidente, audiente, mecânico, intuitivo, inspirado, impressionável, sonâmbulo,
médico, literato, filósofo, moralista, etc. [...] eis um médium completo,
notável [...] Quanto ao valor desses documentos, a julgar pela amostra dos
pensamentos ali contidos, certamente deve haver coisas excelentes. Serão todas
boas? É uma outra questão. Sob esse aspecto, sua origem não é uma garantia de
infalibilidade, considerando-se que os Espíritos, não sendo mais que as almas
dos homens, não têm a soberana ciência. [...] Os espíritos fazem parte da
humanidade e, até que tenham atingido o ponto culminante da perfeição, para o
qual gravitam, estão sujeitos a enganar-se. É por isso que jamais se deve
renunciar ao livre-arbítrio e ao raciocínio, mesmo em relação ao que vem do
mundo dos espíritos; jamais se deve aceitar seja o que for de olhos fechados e
sem o controle severo da lógica. Sem nada prejulgar sobre os documentos em
questão, eles poderiam contar coisas boas ou más, verdadeiras ou falsas; por
conseguinte, teríamos que fazer uma escolha judiciosa, para a qual os
princípios da doutrina podem fornecer úteis indicações.[1]
Mas ai de quem, no
movimento espírita brasileiro, fizer o que Kardec fez e aconselhou a fazerem os
adeptos; ai de quem ousar aplicar os princípios da doutrina ao que dizem os
gurus jesuíticos que assaltaram o kardecismo há décadas, farta munição para
certas metralhadoras mediúnicas, máquinas reprográficas das maiores
fascinações, que só ridicularizam o legado kardeciano por tabela, pois não o
representam verdadeiramente, a despeito de se colocarem à sombra de seu
prestígio e respeitabilidade.
Até quando permitiremos
tudo isso, calados, em nome, aliás, de uma caridade que, em geral,
desconhecemos nas mais comezinhas coisas? Doutrina de gigantes nas mãos de
pigmeus, macacos em loja de louças... Perdoem-me e ajam, insurjam-se, pelo amor de seus filhos ao menos.
[1] Revista Espírita.
Nov/1867. Impressões de um Médium Inconsciente a Propósito do Romance do
Futuro.