Caboclos Bugres
Por
Norberto Peixoto.
A
literatura que fala dos Caboclos Bugres na Umbanda é escassa, creio que quase
inexiste. Fui pesquisar a respeito. Originalmente
este termo "Bugre" foi uma denominação dada pelos colonizadores portugueses
aos índios não "catequizados", ou seja, aos silvícolas mais
aguerridos, muitas vezes fugitivos
perseguidos pelos capitães do mato, que se recusavam peremptoriamente a
se submeterem a uma "conversão" religiosa imposta. Em verdade foi um
"apelido" pejorativo, adaptado para a língua portuguesa da palavra
francesa bougre. Afinal, a França
estava na "moda" na época, pois era o berço do sistema etnocêntrico
europeu que se impunha ao mundo. Originalmente esta palavra significava herege.
O termo capitão
do mato passou a incluir aqueles que, moradores da cidade ou dos interiores das
províncias, capturavam fugitivos para depois entrega-los aos seus senhores
mediante prêmio. Há que se falar um
pouco sobre estes capitães do mato, que gozavam de pouquíssimo prestígio
social, seja entre os cativos escravos que tinham neles os seus inimigos
naturais, seja na sociedade escravocrata, que os considerava inferiores até aos
rasos praças de polícia, e os suspeitava de sequestrar escravos apanhados ao
acaso, esperando vê-los declarados em fuga para depois devolvê-los contra
recompensa. Os mais sangrentos e assassinos capitães do mato foram alguns
“alforriados”, que tinham a benesse dos senhores dos engenhos de cana e
cafezais por escravos trazidos vivos ou mortos – geralmente eram capturados e
assassinados para servirem de exemplo aos demais, desanimando-os de tentativas
de fuga.
Então, os
índios, ditos popularmente como Caboclos Bugres, eram os mais difíceis de serem
capturados e obtiveram a fama de serem mais esquivos e aguerridos do que as
próprias onças brasileiras, matando muitos capitães do mato que por sua vez
acabaram desistindo de os perseguirem, o que fez o ciclo escravocrata se
concentrar nos africanos, mais “dóceis” e fáceis de adaptarem-se às propriedades
agrícolas, por não serem nômades extrativistas como os índios.
A minha
experiência com os Caboclos Bugres é que estas entidades ou linha de trabalho
são espíritos sim, aguerridos, mas não no sentido pejorativo. São os Capangueiros
de Jurema, os que fazem a "tocaia" e prendem os inimigos nas demandas
astrais. Aproximam-se de OGUM como guerreiros, mas são originalmente enfeixados
na vibração de Oxossi. Em minhas vivências mediúnicas, são coordenados pelo
Caboclo da Pantera e mostram-se a clarividência caracterizados de felinos, com peles de onças
e panteras do mato cobrindo-os e as faces pintadas como se fossem
"gatos". São exímios nas tocaias, esperam pacientemente e quando
atacam o fazem com precisão de um esmerado arqueiro, utilizando-se de dardos
soníferos que são assoprados em espécie de “rifles” de bambu (falta-me
nomenclatura mais adequada), assim “neutralizando” certeiramente os inimigos.
Saravá
fraterno,
Norberto
Peixoto.
NOTA: Bugre é uma denominação dada a indígenas de
diversos grupos do Brasil por serem considerados não cristãos pelos europeus. A
origem da palavra, no português brasileiro, vem do francês bougre, que, de
acordo com o Dicionário Houaiss, possui o primeiro registro no ano de 1172,
significando "herético", que, por sua vez, vem do latim medieval
(século VI) bulgárus. Como membros da Igreja Ortodoxa Grega, os búlgaros foram
considerados heréticos pelos católicos inquisitoriais. Desta forma, o vocábulo
passou a ser aplicado, também, para denotar o indígena, no sentido de
"inculto", "selvático", "estrangeiro",
"pagão", e "não cristão" - uma noção de forte valor
pejorativo.