A semente chamada Umbanda foi lançada nas terras do Cruzeiro do Sul, para gerar novas frentes de trabalho em prol do coletivo.
E assim aconteceu...
Por volta de 1853, têm-se no Brasil as primeiras notícias das mesas girantes nos jornais de Pernambuco, Ceará e Rio de Janeiro, fatos que estavam empolgando principalmente os Estados Unidos e a Europa. Mas o interesse por estes fenômenos mediúnicos foi dos intelectuais da época, filhos dos fazendeiros, escritores, enfim, pessoas que possuíam condições sócio-econômicas para fazer a ligação Europa-Brasil, trazendo as notícias sobre estes fatos e, também, os primeiros exemplares do Livro dos Espíritos.
Mas muito antes disso, a mediunidade já era praticada pelos índios e depois com os escravos negros, vindos da África, através do Culto aos Ancestrais.
Os senhores consideravam os negros como seres sem alma. Então, assim que aportavam, recebiam um nome cristão, passando a ser submetidos a um processo de perda de identidade, através de torturas físicas e psicológicas, regime de trabalho rigoroso e agressões morais. Também lhes impunham conhecimentos sobre a religião católica, para que aprendessem a rezar e, assim, esquecessem suas raízes, o que não aconteceu.
Longe de sua terra natal e de seus amados, os negros encontravam no ritual religioso forças para enfrentar as chibatadas, diminuir a dor da saudade de casa e da escravidão.
Os negros, reunidos na senzala, formando agora uma nova família, recriam o ambiente africano e recompõem simbolicamente o Culto aos Ancestrais que fora perdido e desfeito com a escravidão.
Entre os escravos havia muitos sacerdotes, grandes conhecedores da magia, que passaram a mesclar o culto e a cultura africana com o catolicismo. A amalgamação dos Orixás africanos com os Santos católicos ocorreu tanto pela necessidade de encobrir seus rituais como pela similaridade dos atributos entre Orixás e Santos.
Neste momento começou o sincretismo, que muitos anos depois irá se refletir na compreensão dos Orixás pelos adeptos e simpatizantes da Umbanda.
Em 13 de maio de 1888 é sancionada a Lei Áurea e, a partir desta data, todos aqueles que eram escravos foram libertos. Os negros saíram das fazendas com a roupa do corpo, sem dinheiro, sem casa e sem comida. Refugiaram-se na periferia das cidades, em grupo, na extrema pobreza, formando as favelas.
No início do século XX, as cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo sofreram rápido processo de urbanização, com a proliferação industrial. Neste ambiente, após o fim do regime escravocrata, o negro encontrava-se sem lugar, sem amparo, sem estrutura. Por quê? Porque o preconceito vibrava muito forte nos corações daquelas pessoas que poderiam mudar a situação de vida dos negros alforriados, empregando-os. Uma carta concedendo a liberdade não era o suficiente para apagar as discriminações e antagonismo de muitos anos.
Vivendo na marginalização, e possuindo todo o conhecimento magístico, alguns negros passaram a negociar seus trabalhos espirituais para aqueles que pudessem pagar por seus serviços. Surgiu, então, por necessidade, para suprir o próprio sustento, a feitiçaria cobrada. Muitas pessoas de boa situação financeira procuravam estes feiticeiros, alimentando este comércio, não respeitando o livre-arbítrio dos envolvidos.
Neste quadro, a doutrina espírita no Brasil foi se expandindo e cada dirigente queria dar ênfase a um único aspecto da Doutrina. Assim, uns defendiam exclusivamente o estudo do Evangelho, outros davam ênfase ao lado científico, outros se diziam puros, levando à separação, à desunião, à luta dentro do próprio movimento, desestabilizando-o. Foi justamente nessa situação que surgiu Bezerra de Menezes, a fim de equilibrar o movimento espírita, tornando-o forte, coeso e seguro, no sentido de criar condições para que o Brasil pudesse cumprir a sua missão de fornecedor do Evangelho ao mundo.
Nas sessões de “mesa branca” dos centros espíritas só havia a comunicação com espíritos cujas formas de apresentação eram de médicos, doutores, escritores, etc. Desta forma, o kardecismo passou a ser considerado como “alto espiritismo”, enquanto que os cultos afro-brasileiros, por serem formados por pessoas de cor negra ou parda, de nível intelectual baixo e pobre, cujos espíritos que se manifestavam se apresentavam como negros velhos ou índios foram considerados como “baixo espiritismo”.
O Espiritismo havia se direcionado para o intelectualismo excessivo e para a pouca caridade. Mas a Espiritualidade tinha pressa em promover o saneamento das almas, a pacificação dos sofrimentos e desigualdades seculares, trazidos pelas guerras, atrocidades e pela escravidão.
Veio então a Umbanda, diferente do Espiritismo, tendo um vigor atuante, chamando à razão e à responsabilidade de cada um, sem paternalismos, sem céus nem infernos, apenas o cumprimento da Lei Maior.
Então, esta nova religião apareceu com um perfil inclusivo, onde encarnados e desencarnados de todas as raças tem seu espaço para realizar a caridade através da mediunidade.
Fontes:
Das Macumbas à Umbanda
José Henrique Motta de Oliveira
História da Umbanda – Uma religião brasileira
Alexandre Cumino
Monografia Eshu: Senhor dos Mitos
Um estudo de Eshu na mitologia africana, distorções e deturpações cristãs e a visão amplificada e aprofundada da Umbanda.
Fernanda Roberti Aterje