A expectativa era grande. Iniciaram-se as preces. Todos orando com fervor. No centro do salão estavam os médiuns. De repente em deles começou a tremer, gaguejando palavras sem sentidos. Ele sentiu-se puxado, atraído vigorosamente, para o lugar onde estava o homem. Levou um baita susto e gritou tão alto que o médium quase caiu da cadeira. O susto foi geral e todos se encolheram apavorados. - O que está acontecendo? O que estou fazendo grudado neste sujeito? Gritava desesperado. Me larga! Me Larga! Foi acalmado com passes. Custou a entender. Pai Neco falava com ele com amor. Como se fala com um filho querido. Até sua mãe apareceu. Tomou um baita susto, quando viu a mãe morta há mais de 20 anos.
O inverno naquele ano chegou rigoroso e o frio estava de renguear cusco, como dizem os gaúchos, no Rio Grande do Sul. Geadas intensas queimavam a plantação, a água congelava nas torneiras e para fazer a higiene era preciso aquecer a água e despejar nas bacias de ágata ou na pia do banheiro, porque o choque da água fria era tão intenso que parecia que os dentes trincavam. Em dias assim o melhor era ficar em casa, mateando na frente do calor do fogão a lenha, comendo pinhão assado na chapa e proseando. Esperando o dia melhorar e o sol aparecer tímido aquecendo a alma daqueles peões e suas famílias, empregados da fazenda Montes Verdes, cuja sede ficava no meio de umas coxilhas, com o casario dos trabalhadores ao redor, porém afastados o suficiente para não intervir na vida dos patrões. A vista do lugar era belíssima e daquele plano podia-se descortinar um belo pedaço de terra, mais abaixo, com um açude que nesta época amanhecia congelado, num cenário de brancura, que se desmanchava lentamente à medida que o sol aparecia. A fazendo Montes Verdes perdia-se de vista por ser uma grande extensão de terra, com áreas cultivas e outras com criação de gado.
O patrão homem sério e bom administrador, tratava seus empregados com justiça, exigindo a contraparte dos serviços bem feitos mediante salários dignos, até doutor eles tinham a disposição, de vez que o filho era médico e também cuidava da saúde daquela comunidade. Entretanto mesmo tendo assistência médica e bem alimentados, pelas condições do inverno gaúcho, sempre um ou outro pegava uma pneumonia das brabas e batia as botas. Diziam que se sobrevivessem ao mês de agosto durariam mais um ano. E numa noite em que os termômetros registraram quatro (4) graus negativos, o Jovino que passara o dia campeireando sob uma garoa gelada, voltou para casa cabisbaixo, amolado, gelado até os ossos. No inicio da noite despontou uma febrezinha, um tremor, que nem o escalda-pés resolveu e o médico foi chamado.
Jovino, solteirão convicto, um guapo de não se jogar fora, não cozinhava na primeira fervura, encantava as damas com seu palavreado cheio de rimas e uma educação que dava gosto. Morava sozinho, porque não aceitava encosto, nem vida de tico-tico-no-fubá, muito menos de amancebado ou qualquer coisa que o valha. Mas o tempo foi passando e ele não se decidia por nenhuma chinoca de suas relações. Morava numa das pequenas cabanas destinadas aos solteiros. Naquele entardecer começou a tremer de frio, a tossir como um condenado e parecia que os pulmões iam estourar então seus amigos providenciaram o socorro. Quando o doutor chegou estava com quarenta (40) de febre e uma pneumonia poderosa. Não saberia dizer quanto tempo dormiu, não conseguia lembrar desde quando estava deitado. Mas acordou disposto e seguiria para o trabalho já que ficara muitos dias acamado. Estava bem e foi encontrar os peões. Quando se dirigiu para as cocheiras ouviu alguns comentários em voz baixa. Falavam que na fazenda aparecera um fantasma assombrando a todos. Até o padre foi chamado para benzer o lugar, mas o taura d’outro mundo continuava por ali. Jovino que era medroso e tinha pavor de alma penada, resolveu se informar do assunto.
Acompanhou o trabalho no campo, a todas as lidas do dia e se inteirou das histórias que corriam no lugar. Ficou sabendo que o fantasma assustava os moradores da vila, era visto frequentemente nas cocheiras e os cavalos ficavam nervosos e relinchavam sem parar. Ouviam barulhos, batidas nas portas, como visita chegando e quando abriam a porta não havia ninguém. Estavam com medo e pediram providências ao patrão. Um homem de religião fora convocado e todos participariam do encontro. Jovino não gostava dessas coisas, os fantasmas que lidassem com os fantasmas, mas ficou curioso e no dia marcado juntou-se aos demais, louco de curiosidade.
Pai Neco era conhecido naqueles pagos como um homem voltado para a caridade e pela seriedade em sua vida em família e no desempenho de suas tarefas espirituais no templo que dirigia com zelo e afinco. Trouxe com ele alguns membros de sua casa para auxiliar. Jovino sentou-se entre o grupo dos peões preocupados e a conversa girava em torno do fantasma, provocando arrepios em todos, inclusive nele, que se deixou contaminar pelo medo. Não sabia o que esperar. A expectativa era grande. Iniciaram-se as preces. Todos orando com fervor. No centro do salão estavam os médiuns. De repente em deles começou a tremer, gaguejando palavras sem sentidos. Jovino sentiu-se puxado, atraído vigorosamente, para o lugar onde estava o homem. Levou um baita susto e gritou tão alto que o médium quase caiu da cadeira. O susto foi geral e todos se encolheram apavorados. - O que está acontecendo? O que estou fazendo grudado neste sujeito? Gritava Jovino, desesperado. Me larga! Me Larga! Foi acalmado com passes. Custou a entender. Pai Neco falava com ele com amor. Como se fala com um filho querido. Até sua mãe apareceu. Tomou um baita susto, quando viu a mãe morta há mais de 20 anos. Queria sair dali, tinha medo de fantasmas. – Socorro! Socorro! Tirem-me daqui! Então se viu falando por intermédio de um desconhecido. Compreendeu repentinamente porque perguntava e não obtinha resposta. Porque quando se aproximava as pessoas se arrepiavam e faziam o Sinal da Cruz, dizendo cruz credo, te afasta coisa ruim. Então era isto. O fantasma era ele. E como acreditava que tudo terminasse com a morte, ficou por ali. Ao redor dos amigos e da casa. O barulho e o acender de luzes assustou aquele povo. Agora estava explicado. Desatou a chorar e foi socorrido. Levado para um pronto socorro no Astral, para tratamento e depois seria encaminhado para nova encarnação numa família de religião - para estudar e aprender sobre a verdadeira vida, a espiritual. Pai Neco prometera. Ele aceitou. A equipe espiritual que acompanhava o grupo se encarregou dele e por intermédio da intuição e visão etéreo-astral de Pai Neco, foi transmitido a ele a esperança de uma vida futura de aprendizado e trabalho na seara espirita-umbandista. Trabalho sério. Feito com amor e compromisso, de divulgação dos postulados de Jesus, o Cristo que derramou tanto amor entre os homens e ensinou o caminho até o Pai. Mesmo que seja percorrido por milênios sem fim. Mas com a certeza de um dia chegar lá.
Lizete Iria