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domingo, 23 de dezembro de 2012

Pertinho do natal


"Seja o que for que peçais na prece, crede que o obtereis e concedido vos será o que pedirdes." (S. Marcos, cap. XI v. 24.)



O tempo mudou durante a madrugada e quando um raio riscou o céu, seguido do estrondo de um trovão, Marfisa pulou da cama. O dia ainda não amanhecera e o ar carregado anunciava uma chuva torrencial. Apesar da claridade do raio ter iluminado a pequena casa onde morava com o marido Diócledes, ela não ficou assustada. Gostava da chuva. Moravam em uma vila nos arredores da cidade, habitada por pessoas humildes, menos favorecidas. Trabalhadores que sustentavam as famílias com baixos salários.  Eram espaços pequenos e cada família que chegava colocava uma cerquinha e fazia a casa do jeito que podia. Os vizinhos ajudavam, eram solidários. Algumas melhor construídas, outras enjambradas, outras com paredes de tijolo e sem reboco, cobertas com folhas de zinco, pedaços de madeira e até plásticos. Qualquer material servia para abrigar as famílias, tudo dependia das posses de cada um.

O casal havia conquistado um terreninho e naquele chão levantaram sua apertada casa. Quarto, cozinha e banheiro. Ajeitadinha. Ele era ajudante da construção civil e ela diarista. Sonhavam em aumentar a casinha para dois quartinhos, sala cozinha e banheiro mais um puxadinho com tanque. Trabalhavam e se amavam. Acreditavam que alguém olhava por eles, mesmo com todas as necessidades que enfrentavam. Não havia revolta e agradeciam por tudo, apesar de terem o mínimo indispensável para viver.

Grávida de oito meses, o peso nas pernas e a dor nas costas aumentavam a cada dia. Estavam juntos havia cinco anos e um descuido colocou um bebê no caminho deles. Na noite da virada do tempo Marfisa acordou com fome, o jantar modesto não fora suficiente. Levantou e comeu uma banana que era a fruta que restara.  Olhou pela janela da cozinha e percebeu a chuva caindo sonora nos telhados de zinco. Gostava do barulho. Voltou ao quarto e pensou no cansaço e na vida dura. Diócledes estava sem trabalho havia dois meses e o pouco que ganhava mal dava para se alimentarem.  Fechou os olhos e orou pedindo ajuda. Adormeceu e sonhou. Um anjo apareceu sorrindo enquanto a abraçava com amor. Sentiu-se amparada e protegida e despertou com os olhos brilhando. Contou ao marido e foi trabalhar. Sua maior tristeza era não poder comprar nenhuma peça para o enxoval do bebê. O pouco que ganhava não permitia. Já sabia que era uma menina. Fizera os exames e o acompanhamento da gravidez no posto de saúde da vila.

Quando estava trabalhando a dona da casa percebeu sua tristeza e perguntou o que estava acontecendo. Ela contou que não tinha conseguido nenhuma peça de roupa para a criança. Conversando a senhora falou de uma amiga que fazia enxovais para doação. Iria se informar e daria retorno. E assim foi feito. A senhora deu o numero do telefone e o endereço de Maria do Horto para entrar em contato. Um encontro foi marcado para dali uns dias e então ela já estaria entrando no nono mês de gravidez. Perto de a criança nascer.  Dezembro chegara.  Naqueles dias que antecediam o parto já não tinha mais como trabalhar e o marido ainda não tinha conseguido nada. Pensou que o que recebesse seria bem vindo e imaginou que ganharia peças usadas e se preparava para lavar, passar, remendar, o que se fizesse necessário. Mesmo de segunda ou terceira mão era melhor que nada. Teria como agasalhar a filha. Faltavam apenas duas semanas para o Natal. 

No dia marcado foi até o endereço com o marido porque repentinamente sentiu medo. O que seria? Roupa velha? Furada, rasgada, sem botões ou suja, como recebera uma vez numa casa de caridade?  Mas mesmo assim sem saber o que esperar tocou a campainha da casa e uma mulher com cabelos grisalhos e olhar amoroso abriu a porta. Sentiu uma onda de aconchego, um calor gostoso a envolveu e o rosto sereno da mulher se abriu num sorriso quando viu o casal. Estavam vestidos com suas melhores roupas, cheirando a banho, alinhados em sua pobreza. Ela os recebeu com um abraço e foram convidados a entrar.  Conversaram por um tempo, contaram suas esperanças, seus planos. A senhora Maria do Horto já sabia que era uma menina. Serviu a eles sanduiches, sucos e após os convidou para passarem para um pequeno cômodo onde estavam as roupinhas. Quando abriu a porta e acendeu a luz o casal não conseguiu conter um grito de satisfação. Diante deles estava o enxoval mais lindo que já haviam visto. Branco, rosa, amarelinho, verde claro. Tudo engomado e perfumado. Tudo novo. Mais uma cestinha com produtos de higiene para bebê. Era tudo tão lindo e inesperado que os dois se abraçaram num choro incontido e alegre. A filhinha deles ia parecer uma princesa. E a única exigência era cuidar bem das roupinhas e depois doar para quem precisasse. Quando abraçou a senhora, Marfisa lembrou o sonho. O anjo era ela. A enviada do Pai fazendo caridade na terra. Despediram-se e voltaram para casa, felizes e cheios de esperança. O natal chegou e trouxe a eles uma linda menina. Era o melhor natal da vida deles. Um mês depois levaram a garotinha, vestida como uma boneca, linda, cheirosa, para apresentar. O nome da menina Maria do Horto, para homenagear a benfeitora da qual jamais esqueceriam.  


    PEDI E OBTEREIS – A EFICÁCIA DA PRECE (EVANGELHO                                        SEGUNDO O ESPIRITISMO- Cap. XXVII – Item 7 )

     “Concedido vos será o que quer que pedirdes pela prece”.

      ....O que Deus concederá sempre ao homem, se ele o pedir com confiança, é a coragem, a paciência, a resignação. Também lhe concederá os meios de se tirar por si mesmo das dificuldades, mediante ideias que fará lhe sugiram os bons Espíritos, deixando-lhe dessa forma o mérito da ação. Ele assiste os que se ajudam a si mesmos, de conformidade com esta máxima: “ Ajuda-te que o Céu de ajudará”, não assiste, porém, os que tudo esperam de um socorro estranho, sem fazer uso das faculdades que possui. Entretanto a mais das vezes o que o homem quer é ser socorrido por milagre, sem despender o mínimo esforço. ...

   Lizete Iria

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