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quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Amor e boemia - atuando na Linha dos Malandros!


Você sabe o que é ter um amor meu senhor... Ter loucuras por uma mulher... E depois encontrar este amor meu senhor, nos braços de outro qualquer... (música de autoria de Lupicínio Rodrigues)”

A música vibrava na cabeça de Toninho com uma força até então desconhecida. 
Antigamente quando cantava durante suas apresentações, observava divertido a reação das pessoas, que ia do eufórico à fossa absoluta. Agora pensava na força da canção e enquanto caminhava lentamente arrastava os pés na água fria do mar, espalhando uma mistura de água salgada, areia e espuma branca, molhando a roupa que escolhera cuidadosamente para o encontro com os amigos, naquele restaurante a beira mar. Carregava os sapatos atirados num ombro e no outro o violão. O casaco amarrotado e dobrado no braço. Não estava se importando com os respingos que atingiam as cordas umedecendo a madeira. O pensamento fixo, enquanto rumina e voltava a ruminar os acontecimentos recentes que haviam despedaçado o seu coração de boêmio arrebatador de corações, justo no momento em que participava de uma apresentação como estrela principal. Largara sua voz, tocando com maestria e sedução, arrancando suspiros da plateia - das mulheres que sonhavam com seus braços e abraços tentando qualquer estratégia para se aproximar dele e conquistar uma vaga em sua cama. 

Sentou na areia molhada, tirou do bolso uma garrafa de qualquer coisa que fora posta em suas mãos por um dos companheiros de noitadas, que apressadamente o afastara do local. Respirou profundamente o ar da noite carregado de maresia, tomou alguns goles e dedilhando as cordas do violão amigo, entoou uma canção que mais parecia o lamento de um animal ferido. A alma daquele homem estava partida, despedaçada, estilhaçada. A dor era tanta que nem sentia o corpo tremer de frio pelo frescor da noite e pelo adiantado da hora. Daqui a pouco iria amanhecer e Toninho continuava na mesma posição com os olhos fixos no mar. Nem reparou nos casais enlaçados e fazendo juras de amor, deitados languidamente na areia, hipnotizados pelo êxtase da paixão. 

O chapéu Panamá e a gravata perdera em meio ao turbilhão no qual fora envolvido. Mas também, para que serviriam se havia perdido o gosto pela vida? E daqui para frente teria primeiro que juntar os cacos do que restara e ainda não tinha idéia de como fazer. Estava tentando concatenar as idéias e sentiu tanto sono que acabou dormindo na beira da praia. Quando acordou percebeu que havia alguém inclinado sobre ele. Era uma mulher olhando atentamente para suas reações e lhe disse sorrindo:

- Boa tarde, Senhor Toninho. Está se sentindo bem? Fale algo para que possamos observar suas reações.

Ele arregalou os olhos e tentando levantar perguntou onde estava e o que fazia ali, quem eram aquelas pessoas. Afinal porque estava deitado num lugar desconhecido? A porta do quarto abriu e quando viu seu amigo de noitadas, desencarnado dois anos antes, entrando no quarto, num segundo relembrou tudo, do desencanto, da dor, da praia.

Como chegara até ali?

Veio a triste cena na qual sua adorada Lola entrava na casa de espetáculos, abraçada com outro homem, aos beijos e com olhar apaixonado. Sem ao menos respeitar a dor que o havia atingido quando se separaram. Demonstrando descaradamente que o havia trocado por outro, partindo seu coração em um bilhão de cacos. Uma dor lancinante atingiu sua cabeça e caiu pesadamente na cama. Soube mais tarde que estava em um hospital. Fora encontrado na beira da praia, gelado, morrera em virtude de uma mistura de drogas e bebida alcoólica. Levado ao hospital de caridade por um dos casais que namorava na praia e assistiu o momento em que chegou até quando perdeu os sentidos. Socorrido por desconhecidos que ignoravam o drama que estava vivendo. A dor que o consumia. Ele que era um conquistador nato, cantor mais requisitado entre as rodas musicais, que levantava multidões, que trocava de amantes como quem troca de roupas, desdenhando e desrespeitando os sentimentos das mulheres pela qual se envolvia, fora tomado de súbita e alucinante paixão por Lola. Cujo corpo escultural e sensualidade estonteante o haviam contaminado irresistivelmente, perdido nas curvas perfeitas daquela diva do sexo. Porém apesar de todos os avisos dos amigos rendeu-se aos encantos dela, ignorando que sua Lola era frívola, interesseira e pensava unicamente em luxo e riqueza, desprovida de valores morais. E quando ela descobriu que apesar de toda a fama Toninho não poderia lhe proporcionar a vida que desejava, trocou-o frivolamente por outro com maiores posses e mais facilidades no mundo dos negócios. Assim poderia levar a vida luxuosa que sempre desejou. 

Deste modo, sofrendo cada vez que a encontrava porque freqüentavam os mesmos locais de boemia, ele cantando e ela desfilando sua vaidade e arrogância, toda a tristeza e humilhação por que passara feriam ainda sua alma de artista. De enganos em enganos a vida prosseguia e cada um plantava e regava seu carma e seu futuro, com base nas escolhas feitas. O sucesso e a fama não vieram em sua triste vida e mesmo com a tenacidade que investiu na carreira não obteve amor e paz, como conquista pelo emprego de seus talentos e aquisição de valores morais, dos quais era totalmente desprovido. Depois de Lola nenhuma mulher fez vibrar as fibras de sua alma e de seus sentidos esgotados pelo excesso das paixões.

E assim desencarnando carregou consigo toda a carga desregrada de amores e paixões intensas, das quais não conseguiu se livrar devido ao desencarne prematuro, provocado por toda sorte de excessos mundanos, das quais teria um longo tempo e um trabalho exaustivo para se libertar. Muito esforço e tenacidade, estudo e empenho para livrar-se do rótulo de ser um cantor voltado para o sexo e boemia, da dor de cotovelo, dos amores frustrados e da excruciante desagregação emocional que o acometia cada vez que via Lola abraçada, desfilando com seu eleito e que faziam a ligação imediata de sua lembrança com os versos da música...

 “Você sabe o que é ter um amor meu senhor e por ele quase morrer... E depois encontrá-lo em um braço que nem um pedaço do seu pode ser...”

 Lizete Iria - médium do Triângulo.

Nota: Hoje Toninho é um trabalhador astral na linha dos malandros; é um laborioso colaborador na falange do Sr. Zé Pelintra, que auxilia os encarnados para superarem suas mazelas emocionais, recheadas de traições, luxúria, cobiça e sensações desregradas. Notadamente no campo dos que foram alvo da magia sexual, as nefastas amarrações, tão comuns e baratas na atualidade. Espíritos calejados pelas experiências pregressas na vida mundana, são especialistas para a libertação psicológica, das criaturas de si mesmas, ajudando caritativamente os que buscam auxílio no mediunismo da Umbanda.
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